Créditos: Gabriel Lobo.
Evento realizado na Faminas deu voz aos profissionais que estiveram na linha de frente da pandemia e apontaram os aprendizados e consequências deste período
A Faminas, um dos principais ecossistemas de educação na área da Saúde de Belo Horizonte, realizou neste mês o encontro “Lições de uma pandemia: dúvidas e certezas no hoje e amanhã”, que reuniu nomes importantes para o enfrentamento da Covid-19 no Brasil, como Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da saúde e a Dra. Luana Araújo, médica infectologista, que ganhou notoriedade depois do depoimento contundente dado à CPI da COVID-19.
Mandetta abriu a programação e falou para uma plateia de cerca de 700 pessoas sobre a gestão da pandemia no país. Ministro do governo federal na época, o médico relembrou os desafios enfrentados desde o surgimento dos primeiros casos até a sua saída do cargo. “O vírus veio para nos passar algumas lições. Entendemos que ele não ataca apenas o indivíduo, mas a sociedade como um todo. Afeta o sistema de saúde, a educação, o transporte, a economia mundial e seus líderes. Percebemos que havia uma concentração da produção de itens de saúde em um único local, a China. Algo arriscado e que podia comprometer o abastecimento mundial em situações extremas como a que vivemos. E, principalmente, aprendemos que a Saúde não é coisa, é ar, é algo essencial e são as pessoas que a fazem acontecer”, afirmou.
O ex-ministro aproveitou a oportunidade para enaltecer mais uma vez a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) e da ciência. “Nós temos um SUS que é referência mundial em atendimento e imunização. Organizamos o sistema para que ele se tornasse a porta de entrada das pessoas, pois sem diagnóstico não há tratamento. Implantamos a telemedicina e o teleatendimento e, sempre, priorizamos a ciência”, afirmou Mandetta, convocando os estudantes presentes a olharem para o futuro do país. “O Brasil tem que ir atrás da construção de soluções em ciência e é daqui, de faculdades como a Faminas, que vão sair esses profissionais. É preciso diversificar a produção. O país ainda é dependente tecnologicamente em saúde e muitas vezes fica à mercê de janelas de oportunidade. O século XXI começa com a pandemia. É preciso mantê-la viva e discuti-la no campo da ciência. Ainda teremos grandes desafios, em consequência dessa doença, como a maior incidência de diagnóstico de câncer, em homens e mulheres, que não fizeram o controle preventivo no último ano”, alerta.
O evento também discutiu aspectos diversos e fundamentais para a gestão da COVID-19 na prática. A dra. Sarah Gomes, médica paliativista, abriu a programação falando sobre a importância dos cuidados paliativos e da criação de uma força nacional para garantir o apoio aos pacientes e seus familiares. “A pandemia escancarou a necessidade de investimentos nos cuidados paliativos e conseguimos superar alguns deles. Mesmo sem a possibilidade do contato físico, nos mantivemos próximos de pacientes e familiares, de forma virtual, colocando em prática uma comunicação compassiva, controlando os sintomas e apoiando o luto. O mundo se uniu para desenvolver guide lines que preparassem as equipes para esta dinâmica, mesmo em cidades distantes dos grandes centros”, revelou.
Em seguida, Maria Flávia Bastos, doutora em Administração com foco em Negócios Sociais pela PUC/MG, autora e colabora para o desenvolvimento da humanização nas práticas de gestão, apresentou o painel “Aprender, desaprender e reaprender” dando ênfase ao papel do indivíduo e sua saúde mental. “Nós precisamos assimilar as mudanças com a leveza necessária para viver. Precisamos de utopia e esperança para seguir em frente e nos reencontrar em meio ao caos. É momento de acolhimento e aprendizado, de entender que isso tudo nos modificou”, reafirmou.
Na sequência, Maria de Fátima Freire de Sá, doutora em direito pela UFMG e especialista em biodireito, falou sobre a lei federal nº 14.198, de setembro de 2021, que garante a realização de videochamadas entre os pacientes internados em serviços de saúde, impossibilitados de receber visitas, e seus familiares. “A lei que garante o direito de dizer adeus, infelizmente, chegou tarde! Muitas pessoas viveram esse processo de forma muito solitária, no último ano. Mas, ela é importante para minimizar um pouco da dor pela distância do parente. O paciente tem direito a uma videochamada diária, mesmo em estado inconsciente, desde que observado o cuidado com a imagem das outras pessoas e a autorização prévia dos profissionais”, explica.
Um dos pontos altos desse encontro promovido pela Faminas foi a palestra da infectologista Dra. Luana Araújo, que apontou os maiores desafios enfrentados durante a pandemia e o que ainda tem pela frente no mundo pós-pandemia. “Um dos maiores desafios talvez tenha sido perder pessoas próximas, seja um colega, um amigo, um parente, mesmo que apenas conhecidos, foi muito triste lidar com isso. E também as informações erradas e até a falta delas. O que vulnerabilizou e colocou as pessoas em risco. O fato de ter que repetir todos os dias a mesma coisa e explicar de maneira que entendam, permanece sendo desafiador, conta.
Dra Luana continuou falando do momento vivido agora: “é difícil falar em pós Covid quando ainda estamos vivendo o durante. É preciso extrair os aprendizados deste momento”. Ela conclui deixando um alerta: “O Brasil é um dos possíveis nascedouros de futuras pandemias e esta, com certeza, não será a última que vamos ver. Precisamos estar em alerta, pois diversas situações expõem à vulnerabilidade dos humanos, como o desmatamento, que tira do ciclo natural animais e alguns microorganismos”, reforça.